Citações

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“O poder da palavra pode mudar o mundo”.

Segundo muitos, estas foram as últimas palavras do Reverendo Lossar antes de partir para, segundo o próprio, um mundo melhor.

Aqueles que presenciaram a cena comentaram, tempos depois, que o Reverendo dissera aquilo com uma convicção tão grande que, no momento, acreditaram piamente que bastava uma palavra para mudar o mundo.

Mas qual palavra?

“O pior de se ouvir confissões de um moribundo é que ele pode não ter tempo de concluir o que iria dizer.”

Esta era a opinião de Charles, o vigilante, que estivera presente no momento em que o velho reverendo pronunciara suas últimas palavras. Apesar de ter formulado este pensamento, Charles não era uma pessoa má, pelo contrário, acreditara, como os outros, que uma palavra bastaria para mudar o mundo, mas que palavra? Pelo visto o Reverendo levara o segredo para o túmulo.

“Mais um. E em pleno inverno.”

Scott, o coveiro, não era um fã ardoroso de cavar a terra dura da montanha, ainda mais em pleno inverno. Sendo assim, não conseguiu conter as palavras, e, assustado, ouviu seus lábios a sussurrarem quando foram chamá-lo para providenciar o que fosse necessário para que o Reverendo alcançasse seu sono eterno.

“Quinze anos de azar”

Dissera o mensageiro que fora acordar Scott em sua casa. Homem supersticioso, acreditava que sete anos seriam pouco para tamanha blasfêmia, ainda mais em se tratando de um reverendo. Scott amargaria quinze anos de azar.

E fez o sinal da cruz.

Júlia

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O primeiro pensamento que lhe vinha à cabeça era de como tudo, por mais estranho que fosse, era perfeitamente normal.

Se já não tivesse perdido a conta estava ali a pelo menos nove meses, o que era engraçado, pois lembrava o tempo de gestação de uma pessoa comum. Não que ela já tivesse estado grávida, ou que não fosse uma pessoa comum, mas, muitas vezes, os outros faziam com que se sentisse estranha, diferente, e fora do mundo ao qual devia pertencer.

Este era o problema de se morar numa montanha: se não te aceitam, para onde pode ir?

Não que ela não tenha tentado. Anos a fio trabalhou nas estufas, tentando parecer com todo mundo, rir como riam, contar histórias como contavam, viver, simplesmente, como viviam. Mas as cores não ajudavam muito. Sempre as cores. E sua mania de falar sobre elas.

Júlia não entendia como as cores podiam aparecer em lugares tão insólitos. Claro que ela admirava a brancura da neve, o amarelo pálido do sol, e o alegre mar de cores que surgia diante de seus olhos no interior das estufas, mas não conseguia atinar com o por que de uma conversa maldosa ser vermelho vivo, de um sussurro conspirador ser negro, de uma palavra amigável ser branca.

Lembrava-se bem da cor das palavras d’Ele naquela noite. Eram do vermelho mais vivo que já vira, seus olhos marejaram no mesmo instante, e ela soube que algo de muito ruim iria acontecer.

Duas batidas na porta a trouxe de volta à realidade. Pouco depois uma voz, forçosamente agradável, disse:

- Júlia, querida, é hora de tomar seus remédios.

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