Samuel

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Pela vidraça ela conseguiu ver que ele estava lá. Sempre estava, todos os dias, do começo da manhã até o início da noite

Samuel perdera o filho haviam mais de vinte anos, mas desde então se dirigia ao mesmo lugar e lá ficava, quase sem se mover, como que esperando que um milagre trouxesse seu garoto de volta. Com o tempo as pessoas se acostumaram com sua presença ali, na grande entrada da mina, e desviavam dele, balbuciando tímidos cumprimentos, alguns tocando levemente em seus ombros, e seguindo seus caminhos de cabeças baixas partilhando com aquele pai desesperado toda a dor que pode haver no mundo.

Ninguém em toda a montanha era capaz de dizer ao certo quando fora a última vez que ouvira Samuel  pronunciar uma palavra sequer. Alguns diziam que ele não falara mais nada desde a perda do filho, outros juravam que ouviram, pouco tempo depois, ele gritar alucinado para dentro das profundezas da mina o nome de seu "pequeno". O fato é que ele permanecia todos os dias ali, tal qual uma estátua, como um rascunho humano, à espera de alguém que sabiam que não voltaria mais.

No fim da tarde, já quase noite, viam-no se dirigir para sua casa, na Alameda do Conde. Ao entrar pela porta, era como se desaparecesse para o mundo. Nenhuma vela era acesa, nada se ouvia. Pouco a pouco a névoa descansava sobre a terra, e não se falava ou se pensava mais em Samuel. Era apenas mais um triste entardecer para aquele rascunho de homem.
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